sábado, 9 de abril de 2016

Der Prozess

O indutor que nos faz mergulhar no universo dos BALLA tem uma programação negra com uns acordes repetitivos do teclado são a voz de “Persephone” . Surge Armando Teixeira veste de negro e está acompanhado por quatro músicos: na guitarra eléctrica Miguel Cervini, no baixo eléctrico de Pedro Monteiro, na bateria Duarte Cabaça e nos teclados João Tiago, um dos quais é para o cicerone da noite; a visita de BALLA a Coimbra é a propósito do “aniversário da RUC e dos Santos da Casa”. “Carbono Catorze” tem uma melodia poética que é diluída numa efervescência synth, poderia ser uma canção de embalar num planeta utópico, gradualmente as partes desta máquina são invadidas pela Pop com vozes etéreas que promovem o bem-estar da consciência e que instigam a contemplação. “Submundo” é de um pendor pesado sublinhado pelo baixo eléctrico distorcido de Pedro Monteiro, BALLA instauram um mecanismo Krautrock com uma voz austera acompanhada pelo teclado agudo: “Nós podemos ficar bem/Não é preciso mais ninguém”, destaca-se um recrudescer da sua verve instituída pelo baixo e pelo solo da guitarra eléctrica de Miguel Cervini. Armando Teixeira alude a “mentiras esfarrapadas” e agressivamente determina: “Desaperta esse nó”.“Equilíbrio” conjuga um loop sobre o qual se edificam os restantes instrumentos, destaca-se a violência contida do baixo eléctrico de Pedro Monteiro e a omnipresença da guitarra eléctrica de Miguel Cervini. Armando Teixeira solta uma voz grave, “não me vais encontrar”, há um requebro dançante, “pensar”, “dançar”, “quantas vidas?”, “saltar antes de tempo”, “a sonhar”, “abraçar e não dançar”, quando a pausa é anulada as tonalidades Krautrock transmutam-se para o Krautpop, sublinhada pelo solo do teclado de João Tiago. Antes da quinta canção “Natureza Humana” Armando Teixeira volta a comunicar com o público: “Já não tocava em Coimbra há anos”; que é um quadro distorcido da realidade com um pendor dramático enunciado pelo solo da guitarra eléctrica de Miguel Cervini. Armando Teixeira com um timbre sensual, “a natureza”, “a recordar”, “a natureza manda”, BALLA emanam cores distantes do Blues emergida na Pop, “desta vez não me vou enganar”, “abismo”. “Queda” é mais uma canção “do último disco Arqueologia”, determinada através de uma cadência com breaks da bateria de Duarte Cabaça que os multiplica através de uma métrica Pop, a voz de Armando Teixeira é aromaticamente densa, “o que nos move é”, a melodia é docemente dançante, “vamos falar de…”, “dentro dos teus olhos”, falsa pausa, “e tudo em nós será quebrado” . Armando Teixeira conta a “história: quando eu cheguei aos ensaios dos Ik Mux” um dos músicos tocava o “Parabéns”, este havia visto no programa do “Júlio Isidro o Jorge Lima Barreto que não sabia tocar o ´Parabéns”, e desta forma endereça um feliz aniversário ao “Fausto [da Silva]”. “Contra a Parede” é uma brisa com um hálito predominantemente Pop alicerçada num ritmo slow com um beat suavemente electrónico, uma boneca de luxo “não vou saltar”, a voz de BALLA “sou eu”, o baixo eléctrico é envolvente como uma miragem, “sei ao que vou”, sedutoramente “na tua voz”, o solo da guitarra enquadra-se na melodia visceralmente Pop, “para que fugir?”, “sei ao que vou”, “não quero ouvir a tua voz”, que é um canto quase etéreo e digital. “Perfeito Quadrado” sobrevém o groove distorcido que progride misturando o Kraut com o Rock, com solo do teclado de Armando Teixeira e a resposta do baixo eléctrico distorcido de Pedro Monteiro o negrume que instituem é uma meia de gaze pérola a asfixiar um corpo sedento por prazer, “tentar desenterrar”, reinscrevem um canibalismo Krautrock. “Sobressalto” a sua rugosidade é psicadélica e a voz é quase Punk: “Será tão pouco”, que é representada através da guitarra eléctrica distorcida, “é o sobressalto”. BALLA assumem-se como um organismo electrónico que impõe um tempo paralelo, o teclado de João Tiago sola com a persecução do baixo eléctrico distorcido, “e não serás tu”, “tudo o que te resta, tudo o que te resta”, “é o sobressalto: a roda é estreita”. “Ossos” a lentidão é predominante Pop, “uma pista que te mereça”, sedutoramente, “usar todos os ossos”, na correlação de forças destaca-se a guitarra e o baixo eléctrico, prevalece o slow e disparam estrelas. Armando Teixeira no teclado canta: “Alguém que te mereça”, e as vibrações que introduzem são uma violência distorcida, “mas isso já não posso”, solo épico da guitarra eléctrica de Miguel Cervini, “berço”, “vou dançar para esquecer”. “Segunda Pele” citam a Wall of Sound mas com um ritmo synth Pop, e há uma urgência nas palavras de Armando Teixeira: “Se não saltas eu morro/Não te vou mentir/Viver assim é um logro”, “foi um golpe de sorte apanhei-te no ar”, o seu espelho é o teclado dócil de João Tiago, com a intromissão angustiada da guitarra eléctrica: “Viver assim é um logro”. Armando Teixeira após apresentar os músicos que o acompanham, inscrevem a cólera synth em “Quebro” vilipendiada pela guitarra e do baixo eléctrico distorcido, a melodia advém do teclado de João Tiago, “algo se partiu dentro de mim”, a progressão é um novelo impossível de descodificar o principio e o fim, “nada ficará como deixei”, “nada”, “grande estrondo algo se partiu dentro de mim”, “mais nada há a partir”. “Outro Futuro” é representativa para Armando Teixeira porque as “canções começaram a ser importantes às pessoas, esta canção vem desse tempo”. A bateria de Duarte Cabaça é como uma marcha e é o ponto de partida para delinearem uma melodia Pop sombria mas que paradoxalmente convida à dança, “eu não te dei”, “eu não deixei”, a voz de Armando Teixeira é a de um narrador participante que se consagra num espelho soturno, “nem fiquei a um passo de ti”. “Arqueologia” tem uma estrutura synth Pop mas com contornos fantasmagóricos, provindas de um universo tão negro quanto etéreo, “que vivíamos aqui, que aqui houve uma civilização”, a guitarra eléctrica numa repetição de acordes que lhe incutem o prenúncio de que “nem um sinal divino”, o dramatismo reverbera através de cores abstractas e expressionistas, “ao que sempre transbordou”, “avenidas silenciou”, “o último sinal de fumo veio de ti”, “para bem longe”, a densidade cromática é monocromática transcrita através do Krautrock, “nem uma pedra ficou”. Sobre “Mentir Melhor” Armando Teixeira declara: “É uma nova versão” da que consta em “Arqueologia”. É igualmente Pop mas é colocada na década de oitenta por causa dos sintetizadores, “o que passou”, a personagem deseja “saltar” mas não tem “espaço para fugir”, “prometo que não volto atrás”, durante a pausa surge uma som do oriente, “mentir de novo, mentir melhor”. Sobre a penúltima canção “À Noite em Creta” Armando Teixeira informa que tem “letra de José Luís Peixoto”, confiscam gradualmente as cores da noite distorcida pela reverberação do baixo eléctrico de Pedro Monteiro que permitem visualizar ruínas, “arqueologia da verdade”, numa cadência dolentemente Pop, “estava perdido, estava esquecido de quem eu sou”, domina a progressão perturbante, pausa, “onde estiver serás estrela cadente”. A última canção “Montra” tem “um sample dos UHF”, que se desenrola sobre um ritmo de dança com a guitarra eléctrica kitsch de Miguel Cervini, “vou perder”, “vou escalar é sempre a subir”, aceleram o ritmo e a dedicatória a uma figura distante é presumida através de: “Forte como mais ninguém”, coro: “EiLaLa”, a perspectiva sobre a contemporaneidade: “Não vamos ser mais do que uma montra que nos vê a passar”, eco, “passar”, “passar”, “passar”, “passar”, “passar”, “passar”, “passar”, “passar”, “passar”…

BALLA, “Arqueologia”, 8 de Abril, RUC/Santos da Casa 30 Anos, Salão Brazil @ Coimbra