terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Ménage

Maria Helena Vieira da Silva é o centro da exposição denominada, “A intuição e a Estrutura”, que partilha com Torres-García. A maioria das obras pertencem à artista portuguesa, particularmente a década de trinta, quando ainda procurava algo que desconhecia: relacionamento com a arquitectura. Esta forma de arte que é na sua essência uma teia complexa de elementos que se conjugaram com a história ou se estabeleceram de forma dissonante, desde as cavernas até hoje, o seu percurso tem sido determinante para o crescimento do homem com a realidade. Vieira da Silva, exibe os trabalhos de cariz expressionista, figuras de tronco e meio, rostos; desenhos onde se descobre a sua escrita a tentar romper com os preconceitos que a prendiam a um meio estético que a estava a aprisionar. Estes esqueletos já prenunciam os grandes e complexos interiores/exteriores com diversas perspectivas e paradoxais campos de fuga. É o erigir de uma estética, analítico -sintética para com a arquitectura, o espelhar de um pensar repleto de elementos obscuros e que a inconsciência dá a conhecer à sua consciência. Passear pelas salas destinadas à sua obra é conhecer uma alma extravagante, que encontra como “duplo” Joaquím Torres Garcia, um futurista, que explora nas telas estruturas arquitectónicas, assim, como construía pequenos módulos bidimensionais, que questionavam a raiz desta exposição: arquitectura.

“A intuição e a Estrutura” de Torres-García a Vieira da Silva, 1929-1949. 10 de Janeiro, Centro Cultural de Belém, patente de 04 de Dezembro a 25 de Janeiro de 2009.

A fotografia ocupa várias salas do Centro Cultural de Belém, agrupadas por géneros: “Espaços Lugares e Objectos”; “Conceitos e Ideias e Críticas”; “Sociedade e Vida Urbana”, desta forma é possível ao espectador situar-se e orientar-se no meio desta malha de fotografias. Há obras de Nan Goldin ou de Helena de Almeida, de Cindy Sherman ou Thomas Themand, estão registadas encenações díspares, os corpos, as relações dos edifícios, a luz, o nu, o homem, florestas, ilusões e mais ilusões. Podem escolher à vontade, destruir ou até acender um foco sobre cada pormenor distorcido. Muitas são familiares, por causa do curador Delfim Sardo, que assina um texto semanal na revista Única do EXPRESSO onde faz de mestre-de-cerimónias. Como em tempos referiu, “é algo que eu gosto de fazer: escrever uma pequena história sobre uma imagem”. Visitem a Colecção Banco Espírito Santo, a exposição denomina-se “O Presente: Uma Dimensão infinita”, e escrevam a vossa narrativa.

BESart, Colecção Banco Espírito Santo, “O Presente: Uma Dimensão Infinita”. 10 de Janeiro. Patente de 24 de Dezembro até 25 de Janeiro de 2009.

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Costa Brava

Alguém deve julgar que existir é morrer
É a forma mais directa e eficaz de existir
Fechado num elevador ou num armário
Onde a madeira é o nosso corpo de Pinóquio

Quanto às mentiras que sejam calendarizadas
Para que não haja fuga de nenhum feriado
Se não crescer o nariz para a outra margem
Não há saída para o desenvolvimento do mercado
Que expele as suas forças no interior do capitalismo
Trocamos os membros pelo correio
Envio as minhas mãos enceradas e de unhas pintadas
Podes dedilhar o clítoris numa sinfonia clássica
Em cada gemido eleva-se um prazer intemporal
Se é para te vires fá-lo, depois do meu falo
Guarda os beijos na mesinha de cabeceira
Onde escondes o contador e a bíblia envelhecida
Em cada penetração iremos renascer
Pergunta ao padre da paróquia da pedofilia
Ele censura o sexo conjugado com dinheiro
A esmola tem que se colocar na caixa do olho
Este relata o nosso feito aos outros em surdina
Assim não perturba as velhas beatas
Com as perucas de rede de capoeira

Tens formato de mulher primitiva e sensitiva
Que põe de quatro para me sentir no orgasmo
Quanto ao interior tem papel de parede e flores
Se são rosas ou cravos é apenas um período
As estações do ano fertilizam-te num esgar infinito
E as tatuagens são números do abono da família
Encaminha-os para uma repartição das finanças
Ou para a segurança social onde pára o peditório
Para o aborto que amamentas de vez enquanto
Esforço-me para me esticar na tua casa soalheira
A lanterna vê-te nua a desviar o olhar do espelho
Que diz que andas a mentir ao futuro e ao presente
Confisco o dinheiro e lamento o logro do amor
Que palpitava em cada penetração e estoiro

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009


24 Hour Party People

Poderia ser um congresso de gente estranha, sem pés, que se aglomeram a gesticular mas a manter o gesto preso, a contradição ou o paradoxo é uma constante. São esculturas de contorno humano, mas cinzentas, carecas, unisexo, de rostos muito similares mas com pormenores que as diferenciam, é um encontro de freaks de gabardine, que falam uma língua estranha, é esta que domina a forma mais hábil de passar uma mensagem: não dancem, não oiçam, escutem, não olhem para mim, riram-se, os verbos e as suas conjunções podem ser aplicadas ad eternum. Nos corredores estão instaladas varandas de ferro forjado com minúsculas personagens de barro, que observam os visitantes da Museu de Arte Moderna da Fundação Serralves, são de hotéis com vista para anões sentados e dobrados sobre si próprios, o espaço que o circunda é uma alcatifa sintética que o isola ainda mais, ainda mais, ainda. Numa outra sala estão instaladas as telas nocturnas, de interior, mas que são fotolitos diurnos que Juan Muñoz transformou em tétricas noites de Inverno, há mais party people que se vê ao espelho, que encenam uma cena de uma peça de teatro absurdo, a partitura é a solidão, omissão, opressão, ão, cão, a razão que se tem que compadecer com o desaparecimento do seu semelhante ou o crime que comete um crime. Há um palco onde o ponto é um anão, é a única personagem, o seus ouvintes estão ausentes, um outro olha-nos envergonhado perante as colunas clássicas que o rodeiam, circundam, e o fecham numa anormalidade contra a qual é impossível fugir, partir a prisão. A dor é uma constante, a emoção é pura, destila na corrente do olhar, se tiverem medo desta party people, que tem como índole uma existência marcada por uma imaginação viril, que pendura copos irmanados a circular no ar, um bombo perdido, músicos passam droga à volta de uma mesa amarela, sons, boing, boing, o groove é fúnebre, somos testemunhas e participantes do funeral do artista plástico Juan Muñoz, o padrasto desta party, amén.

Juan Muñoz: “Uma retrospectiva”, 04 de Janeiro. Fundação Serralves, patente de 01 de Novembro a 18 de Janeiro.