sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Le Mag

Várias figuras em palco vindas de uma África distante, verdejante e com o rio por perto, ondula num ritmo quente semelhante aos passeantes que traficam verdura para a feira, as mulheres opulentas, transportam alguidares enrolados na cabeça. «Mercy beaucoup, come on di ça on portugais?» Vieux Farka Touré irá colocar esta pergunta constantemente ao longo do concerto que está a decorrer no Teatro José lúcio da Silva (Leiria), e obterá por parte da multidão a respectiva resposta: «Muito obrigado!» Ele veste uma túnica de cobre encarquilhado e está rodeado por vários membros da sua tribo que o ajudam a contar as suas histórias relatadas numa língua rendilhada, tolhidas por uma alegria contagiante, mesmo as canções mais lentas são percorridas por um espírito colorido. A improvisação é matéria que vem à superfície, e não vislumbramos o que vem de origem e o que está a nascer aos nossos olhos, esta invisibilidade permite navegar num rio de anil que enxerga o céu.
Surgem quatro tuaregues destacados para enfrentarem um deserto bipolar que é território de guerra onde prevalece a rebeldia suprema, as guitarras jogam entre si num deflagrar constante que sustenta uma cantoria hipnotizante. Os Tinariwen fazem da electricidade um transmissor lúdico, com elas aquecem a fogueira de palmas que irradiavam do público. O líder, vestido a rigor para ocasiões especiais, dança e ergue as mãos, rodopia e o manto de algodão branco cria formas circulares, o djanbé é o único coração desta delegação da paz e do amor.

Festival Au Désert - O Deserto chega em Outubro, Vieux Farka Touré e Tinariwen, Teatro José lúcio da Silva, 18 de Outubro

domingo, 14 de outubro de 2007

Disco Lag

A plateia do Teatro Miguel Franco em Leiria está repleta de um preto pardo, entra em palco um louro com perfil de SS, olha o público, acena a cabeça educadamente e os espectadores acordam, instalando-se o silêncio. O ecrã anuncia In The Nursery, de imediato segue-lhe o seu irmão clone, que arrebenta com as peles dos tambores marciais, um outro músico ocupa-se discretamente de restos de bateria. A música introdutória assinala o aparecimento da cantora que enverga um corpete que lhe acentua o excesso de peito, não se reflecte na cantoria, fantasmagórica por acidente do destino. Por vezes as programações e os acordes do teclado do SS geram redundância, apesar de espelharem um psicadélico pechisbeque que as impregna de um encanto decadente onde por vezes se vislumbra tons de beleza, por vezes tão tépidos, que aceleram o tempo. «The last time I was here I was pregnant!» surge a filha do Tim Burton, que sofre com a vertigem do espaço vazio e do som excessivo, mas não larga a pandeireta que marca um ritmo infantil.

In The Nursery, Teatro Miguel Franco, 12 de Outubro