quinta-feira, 5 de dezembro de 2024

The Loved One

Noah Lennox mais conhecido por Panda Bear é um músico americano e membro fundador dos Animal Collective, e que se irá apresentar no Salão Brazil que se encontra lotado. Para meu espanto Panda Bear, traz consigo duas teclistas ou processadoras de som, um baixista e um baterista, e o Panda Bear assegura a guitarra e a voz;  porque dada a complexidade da sua música esta seria apresentada através de um teclado ligado a um computador. As primeiras músicas referem-se à uma electrónica que remete para locais tropicais, mas o género é pop quase com a pretensão de ser psicadélica. A partir daqui o leque vai-se abrindo devagar como se fosse um arco-íris que teve início na mencionada pop, para passar para uma versão que se aproxima da pop-rock mas numa vertente psicadélica que gradualmente se esvai para resultar no rock. Este último raciocínio parece simplista, e é o de facto, mas poderemos criar uma trave mestra que se deveria apelidar de pop psicadélica que se transmuta para outros domínios que sejam mais psicadélicos somados ao rock que por sua vez é indie. Mas estas denominações apenas servem para situar o ouvinte sobre quais os efeitos destas sonoridades têm sobre quem está no Salão Brazil, e estes dançam e gritam ao Panda Bear no intervalo das canções, como se estivessem hipnotizados pela sua música.  

 Panda Bear, 4 de Dezembro, Salão Brazil.  

segunda-feira, 9 de setembro de 2024

O Meu País Inventado

Vivencio uma daquelas tardes de Setembro em que o calor é algo ténue e por essa razão efémero. No palco da Praça da Canção em Coimbra a ensaiar as suas canções está a Lene Lovich, o que previa um atraso de uma hora, porém com o acumular de diversos atrasos corresponderia a duas horas (já de madrugada) e por essa razão não vi os M`As Foice. Assim, os Carrion Kids-- já passava há muito das dezanove—tomam de assalto o palco do Luna Fest, o vocalista está vestido à lutador de luta livre; o som é um exasperante punk que se move em blocos destruidores que de tão agressivos são irritantes, há o espectáculo de trocarem de garrafa de tequila que lhes libertam os espíritos para serem ainda mais indecentes. The Twist Connection  são segundo Kalo ou Carlos Mendes uma “local band” que se dedica ao rock and roll mas de onde escorrem largos lastros de pureza, que convertem os mais incautos, e que têm como convidado, nada mais nada menos que Boz Boorer  um prodígio da guitarra eléctrica que trabalhou com “Morrissey or Edwyn Collins”; e desta forma os The Twist Connection passam de trio a quarteto e o som fica ainda mais preenchido, aprofundam as virtudes do rock and roll, e oferecem um excelente concerto. Theatre Of Hate apresentam um rock and roll pleno de subtilezas em que o ritmo lento é simultaneamente denso e leve, e com palavras cantadas em versos abstractos, por vezes o saxofone surge a rasgar toda uma solidão que normalmente está associada à tristeza, são tão profundos quanto inteligentes na forma expressiva de um carrocel fantasmagórico. Lene Lovich surge com um véu pesado a cobrir-lhe a cabeça quando o retira recebe uma pequena ovação por parte do público, as suas canções parecem que derivam das que assolaram Paris durante a segunda guerra mundial, operáticas mas actualizadas e por isso circunscritas a um âmbito pop, é nesse jogo que se espraiam os temas que umas vezes acentuam esta última parte (pop) outras a primeira. The Legendary Tigerman tem uma primeira parte atmosférica ou eletrónica que se funde com o rock and roll-- este é por si só a raiz de grande parte do concerto-- e que irá compor a segunda parte do espetáculo. É neste binómio que a primeira parte fica a ganhar dada a imperial miscelânea, já a segunda parte sofre com uma encenação por parte dos músicos em que se aproximam de um “rock and roll” (repetido até à exaustão) mas que gradualmente se vai anulando a si mesmo; de realçar o facto do Paulo Furtado ter atirado um microfone para o público, algo que poderia ter tido consequências de maior. The Psychedelic Furs, entram em palco, tocam uma canção, recebem uma salva de palmas, tocam a segunda mas a ligação do som da banda com o PA do Luna Fest não se dá e a banda é informada do desastre, e abandonam o palco para não mais voltarem.

Dia 2

Os Birds Are Indie estão a fazer o teste de som dos seus instrumentos musicais que se resumem à bateria, guitarra, baixo e vozes e as suas canções são predominantemente pop, sem grandes preconceitos, aliás é este o facto que os torna numa banda inteligente, reivindicam as regras da pop da mesma forma (por exemplo) que os The Twist Connection às do rock and roll. Johnny Throttle são um quarteto de rapazes de londres que têm por premissa o punk mas um punk que se aproxima perigosamente dos ditames do pub, sem grandes refrões ou riffs distinguem-se pela vontade dos seus elementos em se divertirem, o que já não é mau. Selma Uamusse tem como ponto de partida a música africana mais especificamente a produzida em Moçambique, onde é preponderante o ritmo; de realçar a performance da cantora, que no intervalo das canções discursa continuamente, com o objectivo de evangelizar o público, que não para de dançar; e a Selma dança no meio do público e  convida-o para subir ao palco e este fê-lo; quase no fim reiterou “não acreditem em tudo o que vos disse.” Os Belle Chase Hotel demonstram que são uma das bandas mais inventivas que a cidade de Coimbra viu surgir, a sua pop é de um exotismo delirante, e a juntar a isto estão as invectivas do cantor JP Simões que são de uma ironia atroz, e por essa razão merecem o prémio para melhor concerto da noite. Kid Congo and The Pink Monkey Birds apresentaram um rock and roll repleto de maneirismos vintage, sem lhes ser possível associar-lhes algo que pudesse ser apelidado de novo, mas verdade seja dita que dado o seu currículo não se esperaria que estivesse determinado a uma revolução musical ao género que explorou. Jon Spencer espraia um continuo psicadelismo rock and roll em que brilha a bateria/baixo, mas é a guitarra eléctrica do cantor norte americano que impõe o delírio ao espectador como se fosse uma visita a um hospital psiquiátrico, alguém a que a medicação não lhe controla os delírios que são vozes que se multiplicam e que não são silenciadas pelos medicamentos. Sobre Natty Boo And The Top Cats não há muito acrescentar pois apresentou o género musical misto afro-caribenho calipso excelente para um fim de tarde a ver o sol a pôr-se.

Dia 3

So Dead poderão apelidar-se de post-punk, mas um post-punk em que o que domina é algo venenoso e que se for consumido diariamente pode causar mal-estar psíquico, o único antidoto é paradoxalmente ouvi-los com atenção para que a dor se esvaia ou que rasgue o aparelho auditivo. Weird Omen-- sofreram durante a sua actuação de problemas de som-- dominados pelos acordes brutos de um saxofone, mas a métrica que implementam é de certa forma repetitiva apesar de bafejarem rasgos exemplares de uma elegante pop/rock indie. Club Makumba dominados por uma africanidade tipificada e surripiada a outras bandas do género, para além de ainda se dividirem pelo jazz também ele estereotipado. DEADLETTER-- foram a revelação do festival-- e isto deve explicar-se dada a intensidade do fluxo dos acordes tensos, a entrega em palco de um vocalista em tronco nu que se imiscui no público, a sua voz falada e ou cantada é como uma bandeira que assinala uma revolução, canção após canção elevaram a fasquia e tornam-se irrepreensíveis transformando ou melhor aniquilando a pop indie associando-se a um post-indie, em síntese: excelentes quer na forma quanto no conteúdo. Em substituição dos Mão Morta subiram ao palco os The Parkinsons  (que já haviam marcado presença na edição anterior deste festival) que estão carregados de excelentes riffs com refrões explosivos que misturados dão um cocktail punk mas de teor festivaleiro que incita o público a dançar ou a gritar as letras em inglês cantadas pelo Afonso Pinto, naturalmente explosivos é essa a sua natureza mais profunda; de realçar o facto do Victor Torpedo ter dedicado uma canção à Rita Mano Lopes, por se encontrar doente. The Gories não passaram da década de cinquenta em que o que dominava eram os cânticos dos campos pejados de afro-americanos, que se lamentavam do seu amargo destino, por vezes parece que emulam uma perspectiva fúnebre mas nunca é verdadeiramente alcançada. La Élite é um duo de espanhóis (repetentes da última edição deste festival) que se limitam através de um computador e com a voz ao vivo de debitar canções destinadas para as noites quentes das discotecas de Ibiza.   

Luna Fest, 6, 7 e 8 de Setembro, Praça da Canção, Coimbra.


sábado, 13 de julho de 2024

Poemas de Amor

Tarde luminosa na Praça de Comércio em Coimbra onde estão a tocar sobre um palco metalizado os Três Tristes Tigres a banda debita canções de carácter pop, mas não uma pop condicionada às demandas das rádios, antes apresentam um espectáculo sóbrio onde se destaca a voz melodiosa da Ana Deus e ainda a guitarra eléctrica do Alexandre Soares para além das letras das canções serem da Regina Guimarães.

Apesar da Ana Deus ter dito que o concerto era um “ensaio”; não se notou qualquer registo que tenha manchado negativamente o concerto, antes pelo contrário as dinâmicas entre os cinco músicos estiveram equilibradas, mas um dos pontos que se deve destacar é a introdução dos solos por parte do Alexandre Soares, que pontuavaí os temas com uma intensidade delicada quase como se estivesse a tirar pétalas de um girassol. Outro facto indesmentível é a luz que se transforma numa espécie de felicidade que transborda de canção para canção, sem lugar para cenários obscuros ou outros de similar teor, e as letras visam sobre uma perspectiva crítica sobre a sociedade.

A segunda convidada da tarde foi a Garota Não acompanhada por um coro de sessenta mulheres, que foram mais do que um coro, pois tiveram uma performance que coincidia com aquilo que cantavam e que eram leras que versavam sobre a rotina de uma ou várias mulheres. Mas o foco deve recair sobre a Garota Não, que curiosamente praticamente era também um membro do coro, que apoiada na guitarra eléctrica ou nos adufes foi cantando com um timbre quente, as suas observações e ou preocupações sociais; e a relação entre o coro versus a Garota Não teve momentos arrebatadores… 

 

Três Tristes Tigres + A Garota Não, 13 de Julho, Praça do Comércio, Coimbra.