domingo, 14 de janeiro de 2007

D. Branca

Estudou no Técnico Química mas cedo, “decidi partir para Londres, mas o objectivo era Paris.” Porquê Paris? “Era o centro da Europa.” Paulo Branco veste blaiser castanho, camisa verde e gesticula como se estivesse a conversar num café datado de 1977 com o director dos Cahiers de Cinema, sobre a possibilidade de abrir uma sala de cinema nas imediações do coração de Paris. E o que fazia em Londres? “Lavava pratos”, mas, “nunca fui um exilado político, mantive a inscrição na faculdade e vinha aqui com frequência.” E porque mora em Paris? “Posso passear por Montparnasse e ver os sítios por onde passaram os artistas que marcaram uma época.” O que é um produtor? “É o que tem que procurar os meios financeiros para iniciar a obra, é a pessoa que se compromete a acabar o filme. Só que eu vou um pouco mais longe, porque também sou distribuidor.”. “Quem me incentivou a produzir foi Manoel de Oliveira, eu tinha 28 anos e o Manoel setenta. E produzi de seguida: “Oxalá”; “Francisca” e “Silvestre.” E como é dar-se com tantas pessoas diferentes: “No caso do César Monteiro existiram traições da sua parte e da minha também”, já, “com o Maoel tive a sorte que o “Francisa” fosse elogiado por dois ou três críticos, como uma obra excepcional.” E dá como exemplo: “um amigo comprou um DVD do filme na China. Aaha, mas eu sou pela livre circulação.” Não se importa com isso? “Não, sinceramente, não”. Destaca, veemente, que “já não estou presente durante as filmagens mas tenho gente que me informa.” Mas o seu papel é de procurar subsídios? Ai, não se pode usar esta palavra!?! “O produtor tem que procurar meios. Mas num país onde se dá subsídios para a indústria e agricultura, repare, só existem agricultores por causa dos fundos, caso contrário… porque é que não se há-de financiar o Cinema? A Maria João Pires já abandonou Portugal, a Paula Rego está em Londres e o Emanuel Nunes, que encontro em Paris. Este governo assinou um acordo com as televisões por mais quinze anos, e não incluiu qualquer apoio ao Cinema! O que eles gostam é de futebol. Eu já não digo que apoiem um filme português mas europeu!” Mas da Dois não tem queixa? “A Dois já passou mais cinema do que agora.” Ana Sousa Dias (“Por Outro Lado”) respira fundo; “sabe nos dias em que estava a preparar esta entrevista vi a que deu a Maria João Seixas, e onde realçaram esta sua característica: “vamos começar, depois logo se vê, é que dizem que tem muitas dividas?!?” Ela inclina-se na cadeira e aperta os intestinos, Paulo Branco estica as pontas dos bigodes e exibe os seus dentes amarelecidos pelo Gitanes, o seu risco ao lado, seboso, enquadra o seu rosto de três dias por barbear, enruga-se: “é natural que numa empresa com 25 anos tenham existido altos e baixos.” Os realizadores têm poder total na montagem? “Na América não, na Europa parcialmente.” E zanga-se muito quando as coisas não correm como espera? “Muito, até para evitar uma úlcera, ahahha!”

Paulo Branco em "Por Outro Lado"