segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

24 Hour Party People

Poderia ser um congresso de gente estranha, sem pés, que se aglomeram a gesticular mas a manter o gesto preso, a contradição ou o paradoxo é uma constante. São esculturas de contorno humano, mas cinzentas, carecas, unisexo, de rostos muito similares mas com pormenores que as diferenciam, é um encontro de freaks de gabardine, que falam uma língua estranha, é esta que domina a forma mais hábil de passar uma mensagem: não dancem, não oiçam, escutem, não olhem para mim, riram-se, os verbos e as suas conjunções podem ser aplicadas ad eternum. Nos corredores estão instaladas varandas de ferro forjado com minúsculas personagens de barro, que observam os visitantes da Museu de Arte Moderna da Fundação Serralves, são de hotéis com vista para anões sentados e dobrados sobre si próprios, o espaço que o circunda é uma alcatifa sintética que o isola ainda mais, ainda mais, ainda. Numa outra sala estão instaladas as telas nocturnas, de interior, mas que são fotolitos diurnos que Juan Muñoz transformou em tétricas noites de Inverno, há mais party people que se vê ao espelho, que encenam uma cena de uma peça de teatro absurdo, a partitura é a solidão, omissão, opressão, ão, cão, a razão que se tem que compadecer com o desaparecimento do seu semelhante ou o crime que comete um crime. Há um palco onde o ponto é um anão, é a única personagem, o seus ouvintes estão ausentes, um outro olha-nos envergonhado perante as colunas clássicas que o rodeiam, circundam, e o fecham numa anormalidade contra a qual é impossível fugir, partir a prisão. A dor é uma constante, a emoção é pura, destila na corrente do olhar, se tiverem medo desta party people, que tem como índole uma existência marcada por uma imaginação viril, que pendura copos irmanados a circular no ar, um bombo perdido, músicos passam droga à volta de uma mesa amarela, sons, boing, boing, o groove é fúnebre, somos testemunhas e participantes do funeral do artista plástico Juan Muñoz, o padrasto desta party, amén.

Juan Muñoz: “Uma retrospectiva”, 04 de Janeiro. Fundação Serralves, patente de 01 de Novembro a 18 de Janeiro.