“Grândola Vila Morena”, em registo de vídeo serve de suporte à entrada de uma trupe de comediantes: Homens da Luta, de Neto e Falâncio, a liderarem uma banda proeminentemente acústica. Neto é o comunista do Megafone que luta e assume os “problemas do povo”, é a solidariedade em formato de comício do PREC , a demagogia e o absurdo unem-se. “Vamos reviver o 25 de Abril! Isto não é a Rita Redshoes, só com canções de amor, pá!”. “Eles andam ai, a meter o nosso dinheiro ao bolso”, que está no cerne da, “luta camarada, a luta contra a reacção”, “os tambores lutam”, “é um prazer tê-los aqui hoje”, “luta, luta, camarada luta contra a reacção”. Falâncio é o agricultor ignorante que resume tudo a um vocabulário de dicionário unidimensional: “Reacção”. Neto: “Sejam bem-vindos ao espectáculo dos Homens Da Luta!”, a música é um resumo das angustias do povo, “a corrupção, pá! A recessão pá! Os comprimidos pá! E o povo pá?”, musical, “quer dinheiro para comprar um carro novo”, musical, “o povo também quer Ferraris!”, musical, “camarada da pesca? E o povo pá?”. Apresenta, os funcionários, “Lisnave”, “a nossa facção intelectual da luta a Quinta das Dores”, “no Bombo, o camarada Zé Pereira, uma salva de palmas! Não sejam tímidos, pá!”, “nesta ponta um homem que conduziu o Chaimite de Salgueiro Maia, uma salva de palmas para o soldado de Abril!”, musical, “e o povo, pá?”, musical, “na concertina, a Sesaltina da Concertina, é ela que mete o pêlo nos Homens da Luta”, musical, “na guitarra, o incontornável, kikikikikikirikirikiriki, o camarada Falâncio!”, musical: “E o povo pá?”. “Está Caro”, é “dedicado ao preço das coisas”, os tambores rugem, como numa arruada do PCP onde militam os verdadeiros comunistas. A rotina: “Vamos imaginar um jovem casal, que quer comprar casa. Lá vão eles ao BPN, Caixa, para comprar um T2s no Cacém!”. Resumo: “Lá se vai o ordenado!”, musical, “até ficarem endividados até aos cabelos, pá!”, musical, “lá se vai o ordenado! Isto está caro!”, refrão: “Isto está caro, camarada caro”, “o que faz falta é animar a malta, o que faz falta é dar de comer à malta, o que faz falta é libertar a malta”; “fazias jogo de conselheiro de Estado? O Sr. é acusado? Tá isento? Tem imunidade!”. A luta arrefece o ritmo, mas… “A reacção é só filhos da puta! Mas quando a tarde cai para a revolta, manda-se vir uma Jola e vai-se dar uma volta!”. Na seguinte, “vamos falar dos mártires da luta”, sobre o Tarrafal, “vamos falar dessa prisão que foi a Auschwitz da revolução!”, “eu, camaradas, estive no Tarrafal”, “a gritar feriado que é o meu objectivo”, “os melhores anos da minha vida passei-os no Tarrafal. Eu fui torturado no Tarrafal. A dura tortura do sono, onde nos obrigavam a dormir horas a fio!”. Os cabrões dos torturadores diziam ao Neto: “Seu comuna! Seu anarca! Só queres feriados? Dorme!”, a localização errada da prisão onde esteve Álvaro Cunhal, “na Ilha de Cabo Verde, onde sita o Tarrafal!”. Onde o Neto teve uma experiência homossexual: “Fausto tá aqui alguma coisa entre nós?”, “aí percebi porque lhe chamavam o Anaconda!”, “e ali mesmo aliviei o Anaconda.” . “A luta, quando está calor, ninguém é obrigado a trabalhar!”, conclusão: “A luta assim não dá!”, tambores, “39 graus à sombra é um calor do Diabo”, “o povo calado será sempre enganado!”, “a luta assim não”, numa frequência africana, “kirikirikirikirikiriki”, “o povo calado será sempre enganado”, “a luta assim não dá”, “a luta assim nã dáaa”, Falâncio dança como se fosse membro de uma tribo afro. Desde o 25 de Abril, “muita coisa mudou: antes, havia presos políticos, hoje, temos os inocentes políticos!”, antes, “o povo queria votar e não podia, hoje pode votar e não quer. Antes usava-se muitas metáforas, hoje em dia as canções é só…”, Neto é censurado por Falâncio: “Piiii”. Neto arrisca a falta de decoro: “O meu amigo Ary dos Santos”, imita o Ary declamador de poesia lírica, mas que era dita como se o Ary estivesse a relatar uma epopeia, “eu sou o Ary dos Santos”, o espanto da poética, o Ary confessa a Neto, “tenho um problema que me está a preocupar”, e o que será? “Tenho tesão por ti! Não me chames paneleiro! Isso não!”, Neto constrange-se mas salva o Ary do desalinho: “És homossexual”, e interdita a excitação do poeta, “mas comigo não! Pá!”. “Vamos tocar a ´Tourada` do Ary”, apresentada em formato hip-hop: “pá, pá, pá, pá, pá, pá, pá, pá.”. “Uma salva de palmas para o camarada Ary! O touro é o povo!”, “e depois há aquelas bichonas que querem que o toro vá ter com eles! A gente não mata o touro, metemos sal grosso nas feridas, que ele ainda tem que ir montar umas vacas gordas e dar bifes!”. O momento “Mudasti” é uma canção para o patrocinador da luta, que poderia ser tinto do garrafão ou cerveja, antes, é o chá da Nestea, “mudasti?”. Quanto ao desemprego, “é férias sem emprego”, “e o que se vê agora é só empresas a fechar”, “desemprego pá? Férias sem emprego, pá: E a Quiimonda, pá? E a Toyota, pá?”, flauta, “e a Samsung, pá?”, “e vocês todos, pá? E Portalegre, pá?”. Das melhores, “conquistas de Abril. Eu estou a falar das gajas que se engatavam em Abril!”, “no Galery, chega um gajo da bola e seca tudo. Quando aparece o Ronaldo com o seu amigo Zé, que é o amigo dele, mas não vamos falar de desgraças! Pá!”. “Quem faz um filho fá-lo por gosto!”, a conjugação verbal, “fá-lo”, é relacionado gestualmente por Neto com o seu falo. “Uma conquista de Abril”, o ritmo lento indica paixão, “estou muito sossegadinho e vejo uma rapariga a passar. Uma rapariga do campo”, Neto: “Olá, camarada!”, ela: “Hihihihi”, “olha que tens umas cooperativas muito desenvolvidas. Que tal irmos ali para baixo de um sobreiro? Sentei-a no colo e a minha revolução, já estava em pedra! Parecia a estátua do Cutileiro. Baixei-lhe as cuecas e meti o 25 de Abril, lá para dentro!”, “quem faz um filho fá-lo por gosto”, com predomínio da concertina e das percussões, o Neto mete o Megafone sobre o pénis: “por gosto.”. “Para homenagear esse povo que fez a revolução, dá-lhe Celsetina da Concertina”, a polka embebida em vodka, “aqueles que quiserem, subam ao palco para dançar esta música russa!”, sobem as mães da revolução e outros espontâneos. “A casa da luta é a rua! Vou desafiá-los para ir para a rua, a luta continua quando o povo sai à rua, pá!” Os Homens da Luta páram o trânsito da rua adjacente ao Cinema de São Jorge, apropriam-se de um largo junto a uma estátua, não há cravos, nem chaimites, nem sangue, é o povo a aprender a ser homem.
Homens da Luta, Cinema S. Jorge, 27 de Maio.
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