quarta-feira, 3 de junho de 2009

Autopsicografia

Os Livros Ardem Mal é a designação a encontros com intelectuais, ou, artistas, que se realizam no foyer do Teatro Académico Gil Vicente,(organizado pelo departamento de Letras da Universidade de Coimbra), numa cidade afectada por uma temperatura proibitiva. O convidado é o poeta e cantor dos G.N.R, Rui Reininho, vestido com uma camisa escura e ganga azul, calçado de sapatilhas cinzentas. “Já li alguns livros ao longo da minha vida”, a ironia é acesa pelo Rei, “não sou bairrista, não há canção mais bairrista do que o fado”, sobre, “os jornais ardem mal, eu sempre disse, sobre a crítica, é um acto único.”. Sobre ao facto de lhe ser, “difícil gostar de histórias novas”, quando era ainda criança, “espreitei o Borges”, através dos Círculos de Leitores era, “um sonho aqueles livros chegarem à nossa casa”, “os contos do Edgar Alan Poe”, “esta história dos livros é uma paixão”. Queimar um, “livro é o gesto mais atroz e revolucionário. Dar um pontapé na T.V, apagar a rádio. Mas queimar um livro é preciso coragem!”. “Um amigo meu, que enlouqueceu prematuramente e que foi anestesiado pelos freudianos, dizia: ´todo o pensamento universitário tem tendência para impor a mudança, mas na verdade, tem como objectivo que nada mude`, ahahhah”. Quanto à poesia, “não é para ser lida do princípio até ao fim”, “as minhas líricas comon & anas não têm pretensão, mas que subam ao povo, como diria o Homem Pedro de Melo”. Sobre Andy Warhol: “Ele não tinha a vontade de distinguir a baixa da alta cultura”, a ligação entre o artista plástico e o narrador pop é, “era escrever sobre nada”. O tema, “Bem Bom” das Doce, surgiu numa, “brincadeira, vamos fazer desta maneira-- estas obrazinhas tornam-nos prisioneiros-- com um arranjo à Marques de Sade, para que não fosse o ar de travesti das Doce.”. O Rei chegou a traduzir, “`Sodoma e Gomorra`, até ao primeiro volume é interessante, ele depois escreve numa de papel higiénico”, mas, “todo o meu trabalho tornou-se inútil. Tenho várias traduções que não aconselho, do final da década de 70, durante a qual era editado tudo o que era acabado em ismo”. Sobre o Teatro o trabalho do actor é, “para mim é assustador, repetir adnauseaum, até à exaustão”. Resume o mito: “Acho uma estupidez uma pessoa suicidar-se e não continuar vivo.”. Já quanto o predomínio do português nas suas composições: testemunhou uma conversa entre dois adolescentes, numa esplanada em Tentugal, quando estes viam um cartaz dos G.N.R: “`Não vais ver esses gajos! É uma pirosada do rock cantado em português!`”. Não alinha ao lado daqueles que acham que a nossa língua é “incantável, impronunciável, se pensarmos naquelas obras em alemão, ouvimos peças maravilhosas”, depois, “estudei os desvios fonéticos. Wolfgan, tem uma postura alemã, depois na fase pedreiro livre vai buscar o italiano.”. Na Galiza é interpelado pelos amigos, “Reininho, coño, se tens grupos tão bons porque coño, cantam em inglês? Sentem-se uns colonizados?”. Sobre a sua escrita refere que, “fui-me controlando ritmicamente”, “eu sou um poeta mas ninguém acha isso! Eu procuro as palavras certas, por vezes acordo com diferentes fonemas, já me inscrevi em japonês, em russo.”. O método de trabalho que prefere, “Camilo José Cela: ´quando a inspiração chega encontra-me a trabalhar`”, quanto ao meio, “o computador é bom, por vezes para apagar.”. O “inglês fere-me”, o que mais o impressionou foi o facto de ter visto, “o povo timorense a ser chacinado. Aquela gente a dizer ´Avê Maria Cheia de graça`, não diziam: ´Help me!`” , “em Macau ninguém fala português!”. O seu amigo Pedro Choft disse-lhe que: ´Não gosto muito de rock é um bocado estúpido. Mas se calhar o rock é o último refúgio da poesia`”, contudo, poderá ser muito fácil reduzir a escrita a um "´Obladi, Oblada` de Lennon/Macartney, mas há um poder encantatório que as palavras podem ter.”. Cita, Pedro Mexia: “´O homem não tem pretensão de ser um poeta per si`”, e confessa, “gostava de ter um busto numa rotunda e as pombas defecarem sobre mim, ahhahah.”. E sublinha que, “não há obras menores, somente as obscenas”, sobre os G.N.R, “a nossa função era gozar com toda a gente, e rir de nós próprios. Os surrealistas, no dia em que Paris caiu nas mãos do De Gaulle, os surrealistas, vieram para a rua”, dar vivas ao nazismo. “A Anar Band teve vários equívocos, o Jorge da Chaminé, tocou violoncelo connosco, em 1977 na Figueira da Foz”. O pecado preferido do Rei é: “Vanity is my favority sin.”. Numa entrevista na TVE, perguntaram se os G.N.R eram “pop ou rockopop?”, El Rei: “Si creo que és popRockopop`, tipo Zapatero e companhia, ahahha.”. “É difícil ver o Elvis em Las Vegas, todo aquele super-herói gordo. Dói-me vê-lo”, canta, “are you lonesome tonight? Talvez por isso tenha criado esta personagem da Companhia das Índias, tenho feito mais Cine-teatros, que para mim é difícil porque as pessoas estão sentadas, que foi durante anos um acto de indiferença.”. O que sucede a um Rei Sol? “Uma pessoa com a prática ouve vozes”.

Os Livros Ardem, Rui Reininho, Teatro Académico Gil Vicente, 1 de Junho.