sábado, 31 de outubro de 2009

A Clockwork Orange

As propriedades detectadas neste corpo denominado de Tiguana Bibles destacam-se como um complot armado com doses de independência febril, que por vezes se encaminham para o abismo. O palco está montado na pista de dança da Via Latina, discoteca próxima da Praça da República, que agrega alguns bares onde os estudantes se drogam e embebedam, e discutem o improvável futuro, ou, as aulas na Universidade de Coimbra, o cérebro da Capital do Distrito. Tiguana Bibles começam com o instrumental que é uma passadeira por um deserto banhado por tubarões ensopados em sangue, pinga das guitarras, em particular da Victor Torpedo, um filho do tédio. A música ganha voz humana através de Tracy Vandal, e saia preta com riscas brancas, e um top, que é encoberto por um casaquinho, que encobre os seus ombros brancos. A sua voz é a lava de um vulcão que hibernou num Verão e se ausentou distraidamente, não para a terra do nunca, mas para a aridez que provocam os sonhos premonitórios que nos explicam a beleza. “IT´s against the law”, influenciar as pessoas a se auto-mutilarem, e a se canibalizarem e se exporem aos raios cancerosos. “Child of the Moon” é de compasso acelerado, com o contrabaixo e a bateria a imporem um pendor hell-billy, são o pulsar do edifício, que o fazem tremer mas em simultâneo são os seus pilares: Tracy: “OOOO”. Ela puxa a saia e a boca expande-se pelo microfone, os acordes de, “I Don`t care anymore”, saltitam de guitarra em guitarra, que se inclinam para a esquina onde espreita o rock à espera de violar uma idosa endinheirada, de saia e casaco, o clássico Coco-Chanel, “I Don`t care anymore”. Vandal bebe whisky, despe o casaquinho, ergue os braços e bate palmas, abana as ancas de costas para o público, “so run”, “so run”, “so run”, acordes surf-billy, a cantora retira o microfone do tripé. A movimentação no palco de Tracy, é de uma profunda sensualidade contaminada por uma ironia provocativa que é British. “I saw you in the streets”, mas não esqueças o covil que te aquece e que por natureza te irá transformar em cinza, numa auto-combustão que é um luxo para o portador desta doença rara, “don´t forget your home”, falseto: “I saw you in the streets”, e o impulso é para ser seguido através de um gráfico cardíaco de um hiper-tenso, foge, foge, “runaway from your hooome”, com os Tiguana Bibles, falseto: “UUUUU”, falseto, “UUU”, “UUUU”, “UUU”. “I only now tree words in Portuguese!”, alguém do público entrega-lhe toalhetes para limpar o colo suado, o seu rosto está maquilhado para realçar os lábios e os olhos, mas estes são dois pormenores que magnetizam o espectador. A introdução do oitavo tema é longa e compassada, num ritmo western-spagheti, oiço tiros, sangue, sangue, os bons os maus e os medonhos a cavar a sua sepultura, Tracy recorre à spoken word para narrar o sucedido, dos seus lábios as palavras brotam como se fossem pétalas embebidas num frasco de formol. É a altura para a autópsia realizada pelos solos de Victor Torpedo, que em ziguezague se multiplicam, a bateria de Kalo e o contra-baixo apoiam a guitarra, Tracy: “you”, falseto: “ouououou”, “aaaaa”, “aaaaa”. No primeiro encore a canção é lenta, pautada por “dreams”, e o falseto… “This is a song for all the Boys!”

“Child of The Moon”, Tiguana Bibles, Via Latina, 29 de Outubro, Coimbra.