Tarde de Outubro chuvosa espera ansiosamente pela aparição dos irlandeses U2, que apresentam a digressão “360º Degrees”, no Estádio Cidade de Coimbra, composto por corpos com capas transparentes que ouvem a M80. A banda promove o álbum “No Line on The Orizon”, a capa é uma fotografia de Hiroshi Sugimoto cinzenta tal como as nuvens que rodeiam o palco, composto por um centro onde estão instalados os amplificadores da guitarra, a bateria, e as colunas do baixo, entre estes o microfone de Bono. Este à sua frente terá um fosso de pessoas e duas pontes móveis que lhe permitem estar mais alto do que o palco principal e consequentemente alcançar o segundo palco. Nas extremidades exteriores da circunferência há uma estrutura em metal que se divide em quatro colunas, que progressivamente se vão alongando e se encontram no topo, sob este ponto encontra-se um ecrã circular que tem duas funções: a de projectar imagens e em simultâneo luz. Esta cenografia retro-cibernetica-futurista, é devedora à digressão de David Bowie, “The Glass Spider Tour”, do fim da década de oitenta do século passado. “Space Odditity”, é a música que com as luzes acesas dá sinal para a entrada do quarteto pela esquerda alta. Bono é The Fly, a sua persona que imita Charlot pela passadeira e abre a boca como se as cinquenta e cinco mil pessoas se estivessem a vir na sua boca projectada pelo ecrã. The Edge é o condutor da nave espacial, o impulsionador de uma métrica que oferece a descarga eléctrica sobre o estádio. “Beatiful Day”, “tell me?”, “See the World in green and Blue!”, “get aaway”, “touch me”, a voz ainda não se encontra afinada mas a guitarra mimetiza-a, como se The Edge fosse o duplo de The Fly. “New years Day” é reproduzido com exactidão e melodicamente o teclado é dominante e entrecortado por solos marciais distorcidos circulares e mecânicos da guitarra. “On the Way”, “night and day”, “on the red sky”. “PORTUGAL!”. O hino da ONU dá início a “Get on your Boots”, o universo que predomina é a paz “love and eternity”, “you don´t know”, “you are”, The Edge projecta acordes melódicos distorcidos, estabelecendo-se como o desfibrilador da multidão histérica. “Magnificent” quando perde o pendor progressivo da guitarra, e esta se estabelece num nível inferior em relação à voz, o vídeo ganha relevo, “to be with you”, pop, “I Was born to sing for you”. O reggae cibernético da década de noventa em “Mysterious Ways”, com bailarinas no ecrã a movimentarem-se ao ritmo dos acordes da guitarra, “she moves”, “Living in the ground!”, “love”, “she took a shot”, “to hurt is to steal”, “She sees a man the side of a chiiiild”, “It's all right, it's all right, all right, She moves in mysterious ways”. A voz The Fly é abafada pela multidão, “hands in the air”, “sing with me: ´E-L-E-V-A-T-I-O-N”. Distorção sobre os espectadores que pululam ao ritmo sincopado: “E-L-E-V-A-T-I-O-N”, distorção da guitarra, “E-L-E-V-A-T-I-O-N”, distorção da guitarra, “E-L-E-V-A-T-I-O-N”, distorção da guitarra, “E-L-E-V-A-T-I-O-N”, finalizada num solo angular de tão violento. A turbulência fílmica sobrepõe-se à narrativa de Jesus na “Última Seia”, a papel químico azul: “Killing time”, “Last time We meet”, “I Drank the Wine”, “Everybody having a good time”, os acordes a meio tempo suportam Bono, assim como a secção rítmica: “I took the Money”, “I Kiss your lips”, “Inocent eyes”, The Fly ajoelha-se: “I Kiss your lips”, “Until the End of the World”, “I reach to the one I tray to destroy”, nesse instante as pontes que unem os U2 separam-se com The Edge a encarnar Jesus. “Thank you! Obrigado! Thanks to feel us at Home”, “In our home, it´s bad, bad for our countries. But, That ins`t going to stop this evening”. “I Still Haven't Found What I'm Looking For”, os acordes de uma América idílica é monótona com o público a ter o protagonismo, o ritmo é pop, facilita o sing along. “Pride (In The Name Of Love)”, “one man”, “on a empty beach”,“of love”, público: “LoooVVEE”, “April four”, “Memphys Sky”, “PrIDE”, a distorção afasta-se do original como se fosse uma granada de Delays, a secção rítmica segura e concentrada, público: “In the name of LoveEE”. The Fly veste a capa de estudante católico, “F-R-E”, resposta do público: “Frí!, Fró! Frú! Frá-fré-frí-fró-frú! Áli-quá-li-quá-li-quá! Hurra! Hurra! Hurra”, é o momento em que The Fly é dono das massas, conquistador: de cabedal preto, óculos escuros. The Edge de camisa sintética e o tampão enfiado na cabeça. Larry e Clayton de claro. The Fly: “Público fantástico”. “We are going to Play a new song”, “that we never played before”, “This `s ´A Boy falling from the sky”`, uma canção pop a meio tempo perfurada por solos épicos minimais progressivos da guitarra, “Sky”, “AHAHAHHA”, “AHHAHAH”, “wonder if he is far away from home”, “save yourself”, “try to fly” , “Sky”, “tonight”, “from the sky”. The Fly na guitarra procura acompanhar Jesus, “melody”, “humanity”, “You and I”, “there`s no way”, “you and me”, “EEEEEEE”. “In A Little While”, “Miss Sarajevo”, “City Of Blinding Lights”, todas inserem-se no mesmo ritmo com variações diversas mas maioritariamente a nível melódico. “That girl, that girl is mine”, no ecrã surge o Planeta Terra, “a man takes a spaceship, in to the sky”, surge um astronauta numa nave espacial suspensa no Universo. Na segunda, canção-hino o Pavarotti compareceu, numa estranha relação entre a pop e a ópera, unir culturas é o objectivo de um pacifista, no ecrã: “Roubavas por amor?”. Na terceira o ecrã desce, tem uma steel guitar a encurtar as notas, como se fossem naves espaçais a percorrer, “advertising in the sky for people Like Us”. A multidão acorda com “Vertigo”, “Un, dos, três… catorce”, “is dark”, “hole”, “I ask for the cheque Jesus by the neck”, “feeeeeel”, o ecrã projecta a banda circularmente e rapidamente, o wall of sound da guitarra transporta-a para uma dimensão futurista. “Relax don´t do it, if you want to come” , The Fly de joelhos, “turn on your raadios”, funk, introduz: “Crazy Tonight”, em versão “Discoteque”, com os músicos em movimento constante, os seus rostos surgem no ecrã e sobressai cada um ritmicamente. The Edge e Adam Clayton, a encostarem as costas no centro da passadeira circular, Larry Mullen Jr. com o tambor a marcar o ritmo de uma rave espacial. No ecrã surge um texto em islâmico, estes lançaram a fatwa a Salman Rushdie após a publicação de “Os Versículos Satânicos”: “I Can´t belive the News today”, “Sunday Bloody Sunday”, o solo marcial é a representação da canção alicerçada numa melodia rítmica que pontua “tears away” com uma distorção. No ecrã a eterna Aung San Suu Kyi, o seu rosto sobre um fundo vermelho, Nobel da Paz em 1991, em prisão domiciliária imposta pelos militares da Birmânia. “Radio free radio national”, “to the people of Burma, We `ll stand by you”, ergue o o braço direito e fecha o punho. No ecrã surge um texto que desaparece rapidamente, “be strong”, “Walk on”, “stay safe tonight”, “Walk on”, solo progressivo e semi-distorcido, “leave behind”, “All that you can`t leave behind”. Bispo Desmond Tutu, sul-africano activista e cúmplice de Nelson Mandela é projectado, “the same people”, que estiveram envolvidas no fim do eslavismo nos EUA ou na lei de divisão de raças, são as mesmas que estiveram contra o “Apartheid”, “and finaly one day, We feel as ´One`”. “Do you feel the same?”, “one”, “one”, blues, “Did I disapoint you? Or leave a bad taste in your mouth?”, “too late tonight”, “light”, o ecrã exibe os U2 a sair de um Trabant, próximo de escombros do Muro de Berlim. “Carry each other”, “one”, é uma pérola pop-retro-psicadelica, com a guitarra a assumir a alma de The Fly. “Love is a temple”, solo distorcido, “each other”, “Oneeeee”, solo circular. “Where The Streets Have No Name”, os U2 são projectados no deserto à procura da Joshua Tree um local sagrado, onde possam rezar. O desenho animado, uma cabeça infantil cantarola no ecrã: “This `s Major tom”, “Planet Earth is blue and there´s nothing I can do”. “Sometimes I feel I Don´t Know”, “be strong”, Bono tem um microfone iluminado pendurado da cabeça da Spider, e um casaco que emana luz vermelha, dança e a luz rodopia pelo estádio, é o êxtase da conjugação suprema da pop, “baby, baby light my way”, “Be found”, “Where no one can sleep”, “baby, Bay”, solo distorcido-psicadelico, os U2 aparecem de azul no ecrã. Baixo + Bateria, a guitarra intrometesse, a tragédia é conduzida a uma vertigem, “see the stones in your eyes”, “I Wait for you”, “she makes me Wait”, “With our without you”, a intensidade rítmica é em crescendo, com o solo a prevalecer como a voz da consciência de The Fly. Após “Moment of Surrender”, caem pingos da fotografia de Hiroshi Sugimoto, onde o mar e o céu se encontram. As luzes acesas, os quatro lado a lado na boca de cena, não acenam um gesto de despedida, sorriem, The Fly abraça Adam, riem, The Fly, abre um guarda-chuva e canta: “I`m singing in the rain".
360º Degrees, U2, 03 de Outubro, Estádio Cidade de Coimbra @ Coimbra
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