Os caminhos que se cruzam formam uma cruz que questiona se é possível escolher uma das quatro alternativas talvez se ficar no centro sinta o fluxo que a oriente na direcção que deseja mas escolhe um aleatoriamente para se desresponsabilizar de uma eventual desorientação que lhe proporciona simultaneamente um prazer estranho que desconhece que esteja na origem a adrenalina pode ser que detrás dos arbustos esteja numa paisagem paradisíaca mas o que encontra são restos de ossadas de cães abandonados pelos donos antes de partirem de férias para um sítio onde não os oiçam a latir enquanto morrem à fome ou ao veneno dos vizinhos que habitam cavernas de plástico onde se escondem os parasitas que sugam a electricidade das tomadas e se metamorfoseiam em imagens voláteis que desaparecem em rasgos fugazes e se ela ainda se encontra nas proximidades é porque está estática a mitigar o medo que a sua decisão a levou a tomar e se fosse um lugar familiar estaria rodeada pelos seus filhos e netos e bisnetos e pelos gatos siameses que ouve a ronronar de uma brisa que teima em despenteá-la; The Stoneman são um colectivo que tem como centro o rock em subsequentente canções a meio tempo numa contenção sónica desarmante que são tolhidas pelo americana e por alguns resquícios de country-folk assim como dos blues e deixam para o fim o grunge acresce que executam-nas com um primor que as eleva a um estado de eloquência sublime mas o que as fere são as fronteiras estéticas das quais são incapazes de as transgredir; e tenta seguir em frente pois julga que esse é o futuro mesmo que tal seja uma abstracção que lhe foi imposta pela sociedade servil ao tempo e às suas cambiantes que sem ele seriam felizes deixaria de existir espelhos e outros artefactos que impõe a sua passagem desmedidamente louca e voraz que limpa a terra dos seus rochedos e os transforma em areia que serpenteia como uma cobra cascavel e isto perturba-a e tenta regredir mas o tempo impede-a somente há futuro para desbravar minha querida amiga diz-lhe ela que se não fosse assim ainda estaria mais perturbada e dá passos a medo sobre o soalho de azulejos pretos e brancos e sobe e desce e numa planície tenta fugir mas encontra um abismo que lhe provoca vertigens mas o espaço transforma-se num quadro de insectos que voam ao seu redor e a sirene que ecoa parece que está do outro lado do mundo que lhe é impossível de visionar desconhecia que havia esse género de fantasma nas imediações e não sabe o que pode fazer para se libertar da liberdade que a está a aprisionar se pensa em Deus; IAN actua sozinha e a música é debitada em playback mas que encontra elementos que a tornam orgânica isto é ganha uma dinâmica humana seja através da sua voz ou do violino ou do teclado veste um macacão escuro e enverga uma peruca e estes elementos enquadram-na num artificialismo de boneca de corda mas IAN supera este elemento ao protagonizar uma performance tão equilibrada quanto explosiva que expressa fisicamente as canções que se alicerçam na electrónica que se traduz no hip hop ou no drum and bass e no trip hop que são continuamente decompostos quebrando as regras que os dominam e isto repercute-se numa surpresa que provoca espanto se há algo mais para acrescentar é que Portugal é um “palco” exíguo para IAN; que julga que está sentado num trono de ouro à espera de um outro anoitecer onde debate com violência o Demo que demoniacamente se entrelaça nos tubos de aço que abastecem um navio de fantasmas dispostos a conquistar o além para o desalojarem da sua condição de depósito de almas benignas e malignas julga uma e outra e é incapaz de decidir qual é a sua natureza esse interior que está em turbulência e que se converge contra os ditames morais que a aprisionam mas que encontra neles a segurança para continuar a prevaricar por causa de algo que reconhece que lhe é pernicioso mas mesmo assim bebe do cálice uma e outras vezes para se tentar rejuvenescer e anular a viscosidade que exala pela sua pele que a enoja e lhe provoca vómitos que cobrem a sua cara e nesse sufoco tenta respirar mas ingere os sólidos e os líquidos que a asfixiam lentamente se tem alma esta não se emana do seu cadáver que é perfurado por facas de dois gumes que lhe retiram o sangue e a secura invade as veias e exangue é observada por si como se ela não existisse.
Clap Your Hands And Say F3st! (IAN + The Stoneman), 8 de Março, Teatro Miguel Franco, Leiria.
sábado, 9 de março de 2019
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