quarta-feira, 1 de maio de 2019

The Golden House

Eu talvez seja este espaço que me circunda que parecem paredes brancas que se dobram ao ritmo da tempestade que se abate sobre a cidade filha de um rio e afilhada do oceano Atlântico e esta relação familiar é meramente de uma ordem aparentemente poética destituída de talento de uma poetisa popular que ainda rima os seus versos para os cantar à janela do seu estábulo de vacas envelhecidas com cruzes e canhotos ao pescoço e amadas por camas de hospital e apalpadas por médicos da especialidade e temo que um dia esteja com elas a pedir às enfermeiras por carinho e atenção que é tudo o que têm para dar seja morfina ou um beijo de morte súbita altero-me em novas e constantes observações que se dissipam em esgares que se encobrem num outro olhar visível à luz deste dia pardacento e que obstinadamente me cega e recebo o sinal de um radar que está a identificar quem tem mais speed no sangue e acelero contra um muro invisível e não sei nem percebo porque o sucesso me faz mal torna-me bicho que mente ao seu espelho com rosto de elefante; tarde quente em São João da Madeira e ainda mais tórrida no terraço da Oliva Creative Factory onde estão a tocar os Galo Cant`às Duas (excelente nome mas para uma banda de world music) inseridos no Party Sleep Repeat que tem como cabeças de cartaz os Dead Combo (pelo menos no destaque gráfico nomeadamente nos flyers mas nos horários colados nas paredes são os Parkinsons que encerram este festival) entretanto antes dos Galo Cant`às Duas já tocou o Melquíades e foi-me impossível a presença devido ao atraso rodoviário quanto à dupla destaca-se o baterista do baixo/voz/teclado mas o que resulta desta conjugação são esboços destituídos de qualquer critério estilístico; tarde quente em São João da Madeira e ainda mais tórrida no terraço da Oliva Creative Factory onde estão a tocar os Galo Cant`às Duas (excelente nome mas para uma banda de world music) inseridos no Party Sleep Repeat que tem como cabeças de cartaz os Dead Combo (pelo menos no destaque gráfico nomeadamente nos flyers mas nos horários colados nas paredes são os Parkinsons que encerram este festival) entretanto antes dos Galo Cant`às Duas já tocou o Melquíades e foi-me impossível a presença devido ao atraso rodoviário quanto à dupla destaca-se o baterista do baixo/voz/teclado mas o que resulta desta conjugação são esboços destituídos de qualquer critério estilístico; e aspiro a casa do pó e das bolas de pêlo dos gatinhos e gatinhas com lacinhos no cabelo sejam flores ou diabinhos farruscos e mosquitos de imigrantes disfarçados de pedintes tento um novo lar onde não tenha que lavar o chão e nem a loiça e possa fumar enquanto passa a novela ou perder-me num sono acidental que me levasse ao sonho e se dissipa-se num segundo de romance de cordel centrifugado em imagens esquartejadas por um carniceiro vegetariano tento ausentar-me para um desterro mas estou presa num paraíso que é tão redundante quanto qualquer jardim de virgens esculpidas numa fonte marmórea que cospe saliva que se cola ao céu e as nuvens chamuscam os campos infinitos que brilham de ouro como se fossem girassóis infinitamente mais belos do que este relevo sobre a areia que é sucessivamente apagado pelas ondas que se dissipam com medo de serem absorvidas pela areia e tento o rescaldo das memórias que se apropriam da minha vontade de as esquecer e não consigo debater-me com a inexistência dessa ausência e lamento que este estado se encontre enquadrado com a aridez e frieza do vento e baloice o meu berço como uma nau por esse mar adentro à deriva na esperança; no palco que se situa no fim de um pátio empedrado estão congregadas Astrodome, Jibóia, Conjunto Corona; Astrodome conjugam diversos estilos como o prog e ou o psicadelismo em canções que ultrapassam os 10 minutos infectadas com algum histerismo estético mas inevitavelmente académico valem pelo poder sónico; Jibóia é um contínuo de música de dança na sua forma repetitiva mas com um cunho popularucho algo que é repelente; já sob a noite o Conjunto Corona são do hip hop imerso no dub que emolduram as suas críticas ao que é tipicamente tripeiro e nessa decomposição resulta a repulsa mas numa toada de celebração cáustica que é cantada em uníssono pelos fãs que nos intervalos das canções entoam “Gondomar! Gondomar! Gondomar!” no mínimo é coroa-los como os incendiários dos bairros sociais; que não seja incomodada por nenhuma cegonha ou gaivota subitamente altera-se o local e subo ao palco e danço um tango com o meu doutor que nas horas mortas assobia como se não estivesse a precisar com quem está a falar subjuga-me ao seu amor que surge em mim como se fosse estimulado para engana-lo mas isso pouco importa se sou assim talvez se fosse homem adoraria ser amada por mim mas não sou eu a falar antes a actriz da telenovela bela e altiva e sumptuosamente simpática que deve ser lida com o distanciamento que estas séries o exigem e tento parir-me em pedaços dispares que poderiam rebolar-se pelo chão num estilhaço cósmico centros luminosos que exercem um psicadelismo obscuro e ofusco obstáculos para esta nave espacial que se projecta num emaranhado de promessas dispares e ainda estou desejosa pela próxima cena que seja devidamente encenada para uma peça naturalista tento ripostar sobre as exigências que a sociedade ordena a uma mulher para que seja magra como um cabide andante e que seja fotogénica para ser objecto de atenção alheia e que simbolize a moda que se alimenta de iogurtes magros e de alface e beterraba para que a pele seja resplandecente ao absorver os raios de sol a saúde subjugada a critérios estéticos uma mistura explosiva como um cocktail energético que o meu marido engole antes de ir para o ginásio mas que lhe toldam a libido algo que me deixa um tanto ou quanto doida pois pergunto-me como é que alguém troca sexo por uma barra com anéis nas pontas creio que não devo censurar a sua escolha porque ele ama-me; no palco instalado num renovado armazém é a vez dos Go!Zilla, Glockenwise, Dead Combo, The Parkinsons; Go!Zilla são um somatório de erros na prossecução de serem fieis por exemplo ao prog e ao hard rock e esta fidelidade apesar de se respeitar é a responsável por um equivoco já que nem engrandecem as bandas que citam tornando-se em meras marionetas que tocam instrumentos ou cantam inconsequentemente; Glockenwise são fundamentalmente pop mas rejeitam a sua vertente light já que emitem uma densidade cósmica que é sem dúvida aprazível com uma eficácia assertiva pena que seja imperceptível na maioria das canções perceber o que é cantado em português; Dead Combo instituem diversos universos que aparentemente são familiares já que remetem para África ou para o cancioneiro popular português isto subjugado a instrumentos ligados à electricidade algo que lhes dá uma contemporaneidade kitsch insinuada numa festividade encantatória; The Parkinsons cumprem com a premissa que somente o punk é capaz de outorgar algo que pontualmente associam à pop algo que torna as canções sedutoras mas a combustão é predominantemente punk e a isto soma-se uma performance que é condizente com a música seja o Victor Torpedo afrontar os seguranças ao puxar as grades e a obrigar o público a aproximar-se do palco ou a tocar guitarra sobre um destes e a enfrenta-los como se estivesse em guerra contra a ordem ou as diversas investidas do Alzheimer sobre os jovens ou ao pôr-se às cavalitas de um dos seguranças enquanto canta e este estilhaço sónico dura aparentemente trinta segundos tal como de um sonho de onde é impossível sonhar.

Party Sleep Repeat, 27 de Abril, Creative Olive Factory, São João da Madeira.