segunda-feira, 2 de setembro de 2019

A Liberdade Livre

O festival de surf de cariz internacional que decorreu durante cinco edições no centro da Figueira da Foz muda-se para a praia do Cabedelo onde há dois palcos: um situa-se junto à praia (palco 1)-- onde irão decorrer as diversas provas consignadas ao long board assim como a prática do surf nocturno (algo há muito reivindicado à edilidade pela comunidade surfista da Figueira da Foz) e através desta revolução transformaram a praia no último reduto de liberdade da região centro-- e o outro é fronteiro ao rio Mondego e onde irão decorrer os concertos nocturnos (palco 2); Elephant Maze são uma dupla de destruidores de acordes de heavy metal e de outros universos hard rock e nessa ordem inscrevem algo especialmente vibrante e desafiador a somar a este cocktail a movimentação endiabrada do guitarrista (palco 2); Dead Club são um caso estranho de demência synth que tem contornos repetitivos ou desconstrutivistas numa cadência marcial e por isso épica e a incluir nesta equação a ambiguidade sexual do ou da vocalista e realço este binómio porque por vezes era um outras uma especialmente a cantar e a sua performance é de um confronto contra as ordens morais instituídas pela religião católica (desconcertante de tão soberbo; a seguir com atenção) (palco2). Subway Riders— depois de dois excelentes concertos a fasquia encontrava-se altíssima— mas as provas superam os precedentes pois as canções de diversas índoles seja no pastiche ou no kitsch são apresentadas com uma profundidade emocional eloquente da ordem do divino (palco 2); (esta noite teve como dj Da Chic que se passeou virtuosamente pelo funk e ou pelo disco sound), (palco 2); Manda Blitz uma dupla que usa fundos sonoros pré-gravados sobre os quais sobressaem em diversas cores umas tórridas ou vibrantes que têm como raiz o jazz o senão prende-se quando se libertam das programações e o duo perde a sua eloquência algébrica (palco 1); Ruby Ann & Marc Valentine rodam cds de rockabilly e rock and roll (palco 1); Buster Keaton são um trio de rapazes compenetrados a musicar curtas-metragens do Buster Keaton que na altura era rival Charles Chaplin e a incidência é dividida em dois vectores nos planos curtos (o que pormenoriza o desempenho dos actores) a métrica musical corresponde a esses planos incisivos (com inúmeros pormenores sonoros) quando a sequência é rápida a música é de uma rudeza alarmante o resultado é um delírio para quem gosta de estar concentrado (palco 2); Drunks on the Moon são um casal que tem uma gravidez de contornos melodiosamente densos que evoca o rock de cariz americana ou a pop associada ao cancioneiro francês mas não existe qualquer clivagem entre estes dois universos antes um savoir faire magnifique (palco 2); Birds Are Indie salientam uma rugosidade rock que oblitera a natureza das suas canções pop de recorte britânico mas tal não é negativo antes pelo contrário porque esta revelação ou transposição é tão segura e assertiva que o nervo nunca se quebra antes ganha dimensão de músculo exorbitado mas sempre controlado de forma sublime algo que se repercute no público que reage em diversas moches (impagável), (palco 2); Daltonic Trio Jazz de contornos clássicos a que não é alheio o Miles Davies óptimo para iniciar a tarde junto à praia (palco 1); Palmers delineiam uma sequência de rock indie sem muitos preconceitos ou outros atritos que os possam bloquear se por vezes ou diversamente se são fantásticos isso deve-se à aspereza dos acordes e à sua cadência que é de uma raiva estonteante (palco 2); Wipeout Beat são três máquinas de teclados analógicos processados por humanos e um dos quais por vezes empunha a guitarra eléctrica numa configuração rock que associado à densidade dos teclados remetem para o kraut mas ainda mais marginal do que este género musical pois se sublima para além de qualquer podium e este é reflexo na dança dos surfistas e melómanos (palco 2); PSICOTRONICS encontram no Marquis Cha Cha o centro da sua essência que vestido de Diabo transexual canta e dança mas num registo performativo que é de uma eloquência kitsch e as canções punk synth são decorações de um palácio em que os ocupas dançam dia e noite sem que se apercebam em que tempo se encontram organicamente presos e que ao invadirem o palco o partem (palco 2); Junior Makenzie é um homem de cabelo comprido e barba de vários anos devidamente estilizada e as canções à guitarra acústica e voz grave têm uma latitude norte americana mas de tal forma tipificada que é alarmante a falta de originalidade porém estas tornam-se obsoletas perante a eloquência entre as mesmas pelo músico de Benicassim: “esta música foi gravada com o Paolo Nutini produtor do Michael Jackson eu acredito que o Michael Jackson foi assassinado”; “estava no meio do deserto mas não sabia onde e escrevi esta canção”; “e estava de ressaca e escrevi esta canção”, perante estas provas advogo que siga a carreira de comediante “Makenzie Zoo” (palco 1); Jesse Erikson and the Vessel Virgins (somente foi possível presenciar uma música) e a sua toada lenta remete para o rockabilly mas tal é somente desenhado (palco 2); Niki Moss é um rapaz de boné vermelho mas que se encontra rodeado por outros músicos que se exprimem num indie rock que tem inúmeras fragilidades nomeadamente na estrutura das suas canções algo que se agudiza quando fazem um medley de três canções (palco 2); Aiur Coue têm dois centros o que remete para o onírico outro para o denso e quando se unem numa canção são vertiginosamente belos tal é impossibilidade de os categorizar talvez soturnos e profundos (palco 2); Lonz Dale`s Fantasy a dupla synth rock e house e por vezes tecno rap e outras misturas tóxicas que provocam um vómito corrosivo que se equipara a um reflexo virtualmente da ordem do homem animal de palco que é o de um performer que se traveste nessa irracionalidade que provoca tanto a atracção quanto a repugnância (palco 2); Red Bean Rice são uns adolescentes que ainda se encontram num processo de crescimento criativo que desconhecem o cânone da pop (palco 1); Rapaz Improvisado é um rapaz que raras vezes improvisa talvez essa designação não lhe seja favorável e está acompanhado por um contrabaixista e as canções são de uma delicadeza desarmante evocando diversos estados de espírito num percurso em que se confia no narrador com prazer (palco 1).

Gliding Barnacles, 28; 29; 30 e 31 de Agosto; 1 de Setembro, Praia do Cabedelo, Figueira da Foz.

Dedicado ao Mestre Cruzeiro Seixas.