segunda-feira, 10 de agosto de 2020

Pearls Are A Nuisance

Na rua num pequeno largo em Abiul está instalado o local do espectáculo que tem início pouco depois das sete da tarde cinzenta e húmida um pano de fundo de onde sobressai o casario branco centenário não há um papel no chão ou máscaras cirúrgicas nem tão pouco adolescentes embriagados devemos ser pouco mais de um punhado de espectadores a usufruir dos Fio-Manta uma dupla de músicos que se dividem ou melhor há somente um que troca a guitarra braguesa pela flauta enquanto o seu parceiro discorre na guitarra eléctrica e as composições citam nas harmonias da música clássica ou inserem-se num espectro medieval e nessas variações tão subtis quanto elegantes tramam uma trama intemporal de tal forma que é quase impossível cataloga-los o tempo dirá se se confirmam como uma força motriz de um estilo indie urbano-naturalista que oferece ao cenário de Abiul um outro aspecto com cores ou melhor a cor branca dominante em algo vibrante passam carros com matrículas francesas e do Luxemburgo e um Hummer de matrícula americana e a noite culmina e o frio instala-se como denominador comum e é a vez de Zappa Dada convidar Victor Torpedo e Vera Mahsaty e são estes dois que dominam sendo a estrela de Coimbra a versar através da guitarra eléctrica surf rock e blues psicadélico com ligação à Vera Mahsaty que através da sua imagem de dançarina do ventre corporiza outras formas de dança que ilustram a cadência e a violência da guitarra outras escreve os seus passos como se estivesse desligada de Victor Torpedo um show exótico e erótico de uma envolvência estonteante é a vez de Vera Mahsaty abandonar o espaço e é altura de entrar em cena o Zappa Dada e a relação entre este e o Victor Torpedo é de um diferencial de postura o performer tem uma leitura da realidade a partir de um absurdo deslocado no tempo e no espaço e que é um contraponto que se dilui de canção para canção sendo que estas versam o rock e o industrial para assegurar que o Zappa Dada representasse um Bela Lugosi fascista com alma nazi por fim é Vera Mahsaty que se junta aos dois colegas e a festa é sinónimo de uma diversão sem limites com o endurecer de um psicadelismo que se ramifica em inúmeras variantes que somente um génio como o Victor Torpedo é capaz de eternizar na minha memória ainda não informei por preguiça que estes concertos são da responsabilidade da Galeria Cabaret a sede é contigua ao local do espectáculo e no seu interior de pé direito de adega há sofás e as paredes grafitadas e outras somente rebocadas parcialmente mas isto são meros pormenores sem importância comparados com um pianista anónimo (não se encontra discriminado no cartaz do Festim) que toca uma variação da música clássica ou poderá ser algo inspirado nessa disciplina sendo que é de uma leveza espiritual um tónico fortificante para a abstracção e ouvem-se os acordes dos Ghost Hunt a dupla Pedro Chau e Pedro Oliveira estendem graciosamente um tapete voador com destino incerto mas com escala em inúmeras galáxias a milhões de anos de luz de Abiul transcrevem esse universo de ficção cientifica mas estilizado segundo uma vibração tão minimal quanto o pormenor de um pontilhismo psicadélico o permite que se sobrepõe instando uma multiplicação que se desdobra a flutuar num cenário galáctico que promove a total ou a quase total ausência de que há frio ou que está a chuviscar mas isto não os amedronta a prosseguir o espectáculo até ao fim que se deve etiquetar de grandioso.  

Galeria Cabaret, Festim (Ghost Hunt; Zappa Dada convida Victor Torpedo e Vera Mahsaty; Fio-Manta), 9 de Agosto, Abiul, Pombal.