Na rua num pequeno
largo em Abiul está instalado o local do espectáculo que tem início pouco
depois das sete da tarde cinzenta e húmida um pano de fundo de onde sobressai o
casario branco centenário não há um papel no chão ou máscaras cirúrgicas nem
tão pouco adolescentes embriagados devemos ser pouco mais de um punhado de espectadores
a usufruir dos Fio-Manta uma dupla de músicos que se dividem ou melhor há
somente um que troca a guitarra braguesa pela flauta enquanto o seu parceiro
discorre na guitarra eléctrica e as composições citam nas harmonias da música
clássica ou inserem-se num espectro medieval e nessas variações tão subtis
quanto elegantes tramam uma trama intemporal de tal forma que é quase impossível
cataloga-los o tempo dirá se se confirmam como uma força motriz de um estilo
indie urbano-naturalista que oferece ao cenário de Abiul um outro aspecto com
cores ou melhor a cor branca dominante em algo vibrante passam carros com matrículas
francesas e do Luxemburgo e um Hummer de matrícula americana e a noite culmina
e o frio instala-se como denominador comum e é a vez de Zappa Dada convidar
Victor Torpedo e Vera Mahsaty e são estes dois que dominam sendo a estrela de
Coimbra a versar através da guitarra eléctrica surf rock e blues psicadélico com
ligação à Vera Mahsaty que através da sua imagem de dançarina do ventre
corporiza outras formas de dança que ilustram a cadência e a violência da
guitarra outras escreve os seus passos como se estivesse desligada de Victor
Torpedo um show exótico e erótico de uma envolvência estonteante é a vez de
Vera Mahsaty abandonar o espaço e é altura de entrar em cena o Zappa Dada e a
relação entre este e o Victor Torpedo é de um diferencial de postura o
performer tem uma leitura da realidade a partir de um absurdo deslocado no
tempo e no espaço e que é um contraponto que se dilui de canção para canção
sendo que estas versam o rock e o industrial para assegurar que o Zappa Dada
representasse um Bela Lugosi fascista com alma nazi por fim é Vera Mahsaty que se
junta aos dois colegas e a festa é sinónimo de uma diversão sem limites com o
endurecer de um psicadelismo que se ramifica em inúmeras variantes que somente
um génio como o Victor Torpedo é capaz de eternizar na minha memória ainda não
informei por preguiça que estes concertos são da responsabilidade da Galeria
Cabaret a sede é contigua ao local do espectáculo e no seu interior de pé
direito de adega há sofás e as paredes grafitadas e outras somente rebocadas
parcialmente mas isto são meros pormenores sem importância comparados com um
pianista anónimo (não se encontra discriminado no cartaz do Festim) que toca
uma variação da música clássica ou poderá ser algo inspirado nessa disciplina
sendo que é de uma leveza espiritual um tónico fortificante para a abstracção e
ouvem-se os acordes dos Ghost Hunt a dupla Pedro Chau e Pedro Oliveira estendem
graciosamente um tapete voador com destino incerto mas com escala em inúmeras
galáxias a milhões de anos de luz de Abiul transcrevem esse universo de ficção
cientifica mas estilizado segundo uma vibração tão minimal quanto o pormenor de
um pontilhismo psicadélico o permite que se sobrepõe instando uma multiplicação
que se desdobra a flutuar num cenário galáctico que promove a total ou a quase
total ausência de que há frio ou que está a chuviscar mas isto não os amedronta
a prosseguir o espectáculo até ao fim que se deve etiquetar de grandioso.
Galeria Cabaret, Festim
(Ghost Hunt; Zappa Dada convida Victor Torpedo e Vera Mahsaty; Fio-Manta), 9 de
Agosto, Abiul, Pombal.