Encontro-me numa fila à
espera de entrar no festival Gliding Barnacles, porém não tenho bilhete apenas
o convite oral de um amigo que está a cumprimentar-me e a dar-me ânimo para que
espere que a questão do bilhete é de somenos, (será?): que me encontro em lista
de espera para entrar num centro recreativo e diversão do long board, porque há
inúmeros rostos conhecidos de edições anteriores e que fazem do festival um
ponto de encontro apesar de estar actualmente agendado no Outono, mas isto
pouco importa aos estrangeiros que andam de chinelos ou às surfistas que exibem
as longas pernas como se estivesse um dia radiante de Agosto, oiço ao longe uma
banda a tocar uma versão dos Nirvana e uma outra dos Rolling Stones: que
infelizmente perderam o Charlie Watts que os acompanhava há quase seis décadas
e estão por estes dias a enfrentar a primeira digressão americana sem ele na
bateria, parece que não há nada que pare os Stones, talvez quando tiverem cem
anos cada um estarão a rockar em holograma e nessa altura até o espírito do Brian
Jones poderá ser reintegrado na banda; e ouve-se Nirvana ou o tiro fatal do
Kurt Cobain, tal foi o embate da bala no meu cérebro que morri mas contrariamente
ao Kurt Cobain ressuscitei, isto é, enterrei o grunge e libertei-me do seu jugo
estético; o que sobrevém das colunas são os Artic Monkeys ou melhor uma banda
que faz covers dos músicos ingleses, e o que aparenta serem originais não são
muito originais porque remetem para a banda do Alex Turner, não deixa de ser
uma boa surpresa encontrar-me sentado num sofá com os amigos e a ouvir uma
banda tão cobiçada, para além de que o que tocam por norma é complexo e estes
rapazes tocam com a mesma ou maior complexidade, os meus parabéns; para
encerrar a noite de sexta-feira alinham os Wipeout Beat que se apresentam segundo
a regra mais simples e por acaso a mais complexa retirar de uns míseros teclados
matéria suficiente para que a multidão entre em delírio e isso passa pela mosh
intensa, há quem se pendure a um barrote no tecto e faça o papel do fã surfista
enlouquecido, mas o delírio é incontrolável assim como a fonética kraut rock
trans pop que incute aos surfistas que estão perante uma onda de tubo perfeito;
mais simples e rápida a minha entrada no segundo dia de festival, mas menos
diversificada a nível de bandas a que se encontra no palco toca António
Variações misturado com originais em inglês, há pouca coesão apesar da
tentativa de anular esse senão algo que é pontualmente conseguido; alguém
acende um misto de cigarro com THC que rodopia de boca em boca sem medo do Covid
que tem condicionado a vida deste país e de tantos outros, sinto-me orgulhoso
com o acto tresloucado dos fumadores que diria que se tivessem um coração tão
benigno que não fosse capaz de infectar com um vírus potencialmente fatal;
parece que é a vez de um tal Narciso que tem maquinaria suficiente para
apresentar num conjunto de instrumentais destituídos de qualquer sentido
estético, que torna o seu desempenho em algo entediante; Victor Torpedo and the
Pop Kids apresentam a sua ementa onde constam pratos partidos pelo punk mas que
nunca é totalmente deixado ao seu livre arbítrio e os Pop Kids seguem o líder
seja quando deambula pelo lo-fi ou se transfere para a dança desalinhada com a
realidade, é determinante que se esclareça que a ambiguidade pop/rock apenas
joga em favor do Victor Torpedo porque questiona o ouvinte sobre a sua
capacidade em se integrar nos diversos e divertidos géneros musicais e nesse
plano é didáctica.
Gliding Barnacles, 24 e 25 de Setembro, Praia do Cabedelo, Figueira da Foz.