HHY & The Macumbas
apresentam-se sob diferentes prismas: a música ora se decompõe em estruturas
tribais ora se compõe num hipnotismo que resulta numa ode operática que coloca
o ouvinte em contacto com o divino e com o profano como se fosse a mistura num
copo de vinho amargo que transmutaria os peregrinos em seres cornudos e outros em
anjos dançantes em redor do fogo profano as almas sumptuosamente divagam
entrecruzando-se e se digladiam ou se transmutam numa só peça de escultura
erguida para que seja adorada ao som das variações rítmicas umas vezes
profundas e hereges e outras celestiais; parece que o que domina no contexto
sonoro dos HHY & The Macumbas são bifurcações que se encontram num mesmo
leito de rio de sangue fruto de um sacrifício e este ponto é fundamental para
que a música corra sem que seja questionada a sua origem; se fossem recolocados
num terreno inóspito seriam reveladores de maravilhas de diamantes ou
brilhantes de sangue porque se existe progresso isso deve-se à exploração da
matéria prima que enriquece os países pobres, tal como a música que advém do
palco que é rica (não no sentido literal do termo) porque tem origem nesses
tais países africanos e onde se encontra o berço castrado dominado por
elefantes moribundos e rinocerontes em fuga dos seus carrascos; o concerto que
dura uma hora não há qualquer pausa o contínuo é revelador de que a relação do
pensamento tem inúmeros níveis de entendimento que se entrecruzam e são
potenciadores de atar um outro estado de espírito ao ouvinte que tem que ter
confiança na narrativa sonora deixar-se levar de olhos vendados por uma
floresta ou pela savana e não ter medo que qualquer ser estranho possa aparecer
de repente de forma a que seja suficientemente forte para instalar a anarquia e
a demência porque é esse estado de transe quase demencial que se situa a
tragédia dos HHY& The Macumbas se há esperança é apenas no limiar da mesma
se há felicidade é porque os corpos podem transpirar e libertar o mal que por
si só é o primórdio daquilo que se pretende exorcizar e somente o mal para que
daqui em diante seja o bem como advir de um outro universo mais amplo e belo
que recusa as trevas e faz delas cinzas somente destas é possível que algo seja
eterno e que desmontado o cenário seja o bem a dominar os corpos cegos perante
a montra do escuro ou obscurecido que relata o pormenor e transformam em algo
maior o que não é domesticável; os ecos de uma nova civilização estão
proscritos em cada acorde porque é quase do tempo em que as ligações entre os
seres vivos eram composta exclusivamente por sons que gradualmente simbolizaram
a coisa em si e que sustentou uma nova forma de comunicar; a música é o seu
elemento mais revelador que de outra forma seria impossível transmitir HHY
& The Macumbas que são um manancial que despertam os sentidos para um outro
mundo que inconscientemente é reconhecível para quem se presta a ouvi-los com
atenção e dessa forma possa perspectivar quiçá algo similar ao que Picasso
descobriu com a arte africana o cubismo é nessa perspectiva de transposição do
sagrado para um nível de contexto contemporâneo que estes músicos se enquadram
haja felicidade por uma hora sonora deslumbrante.
HHY& The Macumbas,
6 de Novembro, Teatro José Lúcio da Silva, Leiria.