domingo, 5 de junho de 2022

Werther

A associação entre a Orquestra Jazz de Matosinhos e Rui Reininho encontra o seu segundo capítulo na Praça Real Vinícola (antes havia decorrido na Casa da Música) inserido no conjunto de concertos Jazz Na Real Vinícola; o cantor dos GNR traz consigo o Alexandre Soares e o Paulo Borges que juntamente com a orquestra (maioritariamente constituída por metais) executam as canções que decorrem do segundo álbum de originais de Rui Reininho “20000 Éguas Submarinas”. A relação que estabelecem é a de acentuarem os elementos estéticos que se evidenciavam em cada um dos temas do álbum, isto sem serem meramente retratistas, mas na procura de evidenciar pormenores que se encontravam no subtexto da linha melódica dos originais: onde há delicadeza e profundidade acentuam-se as mesmas, onde há excesso e opulência acrescenta-se ainda mais a densidade; destas ondas sonoras (o que remete para que esteja inerente uma ondulação que não afecta somente “Fartos do Mar” mas também as suas congéneres) provém universos abstractos e outros oriundos-- de e por exemplo-- do flamenco a sua coexistência confere às canções uma profundidade extravagante pois se encaixam sequencialmente ora derivadamente e tendencialmente criando um “big picture”. Porém e comparativamente quando Rui Reininho se apresenta somente com os seus quatro comparsas há um aprofundar senão mesmo um denso sublinhado sobre o psicadelismo que confere uma dimensão “inconsciente” às canções, mas dado o facto de a orquestra ser composta por metais a que se juntam uma bateria e um baixo  eléctrico, as opções teriam que passar obrigatoriamente por esse conjunto de músicos, logo essa dimensão psicadélica está alienada dando espaço  a arranjos  que complementam as canções noutros domínios (como o aqui evidenciado flamenco),-- resolvendo assim-- o que em quinteto era uma constante enunciação que se insinuava e se exprimia para além da moldura do tal “big picture” extravasando as suas fronteiras mas sem se perder a narrativa sónica. A surpresa final é “Sete Naves” --original dos GNR e uma das composições co-escritas com o Alexandre Soares, um dos membros fundadores do Grupo Novo Rock-- e que a Orquestra Jazz de Matosinhos transforma numa tempestade, mas em vez de soprarem ventos adversos sobre embarcações fantasmagóricas há uma felicidade destemida contra toda e qualquer perturbação que se torna numa esperança que enche de força os marinheiros que usam a voz do Rui Reininho para se vingarem de residirem no além, e o único desassossego é ouvirem-se através da sua voz e por essa e somente por essa razão sentirem-se vivos. 

Rui Reininho & A Orquestra Jazz de Matosinhos, 04 de Junho, Jazz Na Real Vinícola, Matosinhos.